Quando a crise se torna profunda ao ponto de ser percebida como insuportável, a saída, em geral, tende ao messianismo. É o que está acontecendo no Brasil. No mundo, para ser mais preciso. Foi o que ocorreu, por exemplo, na extensa tradição bíblica, culminando no movimento apocalíptico (cujos exemplos mais elaborados no cânon são o livro de Daniel e o do Apocalipse). A História se revelou de tal forma esgarçada que a esperança passou a apontar para além dela. Os apocalípticos bíblicos, todavia, produziram críticas severas aos donos do poder de seu tempo. Mas como foram - por força das circunstâncias - simbólicos e enigmáticos demais, a interpretação de seus textos já serviu, ao longo dos séculos, até para contrariar a militância de seus propósitos. Teses absolutistas, capitalistas e socialistas já se fundaram no apocalipsismo bíblico (apesar de haver quem ainda ache que política e religião sejam discursos distintos). O risco que a crise promove, além de seus efeitos imediatos, é a fé depositada numa salvação que não passa pelos processos históricos e políticos, mas pela irrupção salvadora de um messias (ou o que o valha). O problema está em quem manipula esse discurso; em quem consegue usurpar a ideia de que é o portador dessa salvação. As experiências que tivemos não foram boas; é uma porta aberta para a tirania. É por isso que a crise tem sua pior herança na desconstrução da fé no futuro, que passa a ser uma ameaça. Mas nada disso é exatamente novidade: por aqui, nossa política sempre foi muito populista. Desde o discurso da eficiência liberal até as musiquinhas dos avanços sociais. Adoramos messias salvadores e bodes expiatórios. Uma sociedade séria não se constrói sobre falsas e efêmeras expectativas. Dom Sebastião morreu. Precisamos aceitar. Dói menos. Deus nos salve dos Messias que andam por aí.